11.12.10

Diário de um Linfoma II

 

Perguntam-me como me mantenho tão calma e de sorriso nos lábios. Que se fosse com eles esperneavam e gritavam e choravam com o desespero, como se a revolta fizesse o tempo voltar atrás e trouxesse a súbita e miraculosa cura. Vamos lá a ver, eu não sou nenhuma heroína. Não faço mais do que muitas e muitas pessoas que passam pelo mesmo que eu. E há que manter em mente que há muita gente no mundo que passa por coisas bem piores. Passar fome e frio deve ser bem pior.

Há dias bons e dias maus. Até agora, e depois de seis tratamentos de quimioterapia, o balanço é francamente positivo. Tirando uma meia dúzia de dias mais difíceis a nível físico e emocional, tenho passado bastante bem. É claro que o cabelo já se foi; o paladar foi-se mas voltou, o que é excelente pois voltei a alimentar-me sem ter a sensação de estar a comer palha; dores ósseas também já as tive (e não se esquecem facilmente) mas fiz-lhes frente e as gajas deixaram-me em paz; há dias em que eu fico implicante com o cheiro de tudo e mais alguma coisa, a ponto de não pôr amaciador na lavagem da roupa ou detestar o gel de banho, mas tenho conseguido até agora (só desejo que continue assim) encarar cada mau estar com a perspectiva de que o dia seguinte será melhor. Amanhã é sempre outro dia!

Nos dias maus mais vale ficar quieta e sossegadinha e esperar que passe. Como o dia em que acordei com a cara tão inchada que nem conseguia ter os olhos abertos. Todo o dia. Assustei-me um pouco, confesso. Não era eu no espelho. Os corticoides têm destas surpresas, e os médicos nunca nos dizem tudo.

O que eu quero dizer é que sim, é difícil encarar o cancro, é difícil aceitar que somos nós e não o vizinho que tem uma batalha dura pela frente, mas acredito que o espírito e a coragem que se investem nesta luta são fundamentais para o bem-estar do dia-a-dia e para a vitória. Vale a pena espernear contra aquilo que está dentro do nosso poder de alcance, que podemos de alguma forma controlar. Espernear (entrar em negação) contra o que está fora de nosso controlo é perda de energia, e energia é algo quase precioso nesta luta. Portanto, o que está fora de meu controlo: o cancro. Tenho-o, está cá, pretende ser o meu melhor amigo, e não é por eu me revoltar que ele desaparece. O que eu posso controlar: a aceitação, a minha disposição, fazer a quimioterapia e tomar a medicação de forma certinha, alimentar-me bem. É uma escolha. E eu decidi que não é o linfoma que me vai derrotar. Eu sou demasiado teimosa, demasiado persistente, demasiado cheia de mim mesma para o permitir. Nunca, em momento algum, me passou pela cabeça sequer um fragmento da ideia de que eu estaria condenada, de que o linfoma seria mais forte do que a minha força. Nem vai passar! Nunca! Porque ainda tenho demasiadas coisas para fazer, demasiadas ideias, demasiados projectos, tenho demasiada vida dentro de mim para permitir o contrário. O bicho está de certeza a fazer as malas e a bater em retirada. Para nunca mais voltar!

Cat

4 comentários:

afectado disse...

De certeza que sim! Força.

noiseformind disse...

Ja pensaste em usar como terapia Chocolate ou Malagueta?

Sao ideias : )))))

Boa sorte com os tratamentos.

Rafeiro Perfumado disse...

E se precisares de ajuda para levar as malas, avisa!

Beijoca, mulher de coragem!

Cat disse...

Afectado, obrigada pelo apoio! :)

Noiseformind, e se forem os dois juntos? ;)
Bem vindo!

Rafeiro, combinado! Obrigada! :)